segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

As iludências aparudem

Quem aterrar hoje no planeta Terra e descobrir que uma equipa em Portugal ganhou dois jogos seguidos em casa por 4-1 e 5-2, certamente achará que estamos perante uma equipa avassaladora e demolidora. Ou não.
Quem esteve em Alvalade nos dois últimos jogos certamente que sentiu o mesmo que eu: um Sporting com muitas dificuldades em entrar no jogo, revelando uma estranha apatia peseirista, perante adversários bastante audaciosos na forma como procuraram acercar-se da nossa área. Em ambos os casos começámos por perder (e bem), mas fosse por génio individual ou por inspiração colectiva, lá acabámos os dois jogos em cima do adversário e a cilindrá-lo. Pelo meio preocupam-me as dificuldades inesperadas que equipas de meio da tabela nos conseguiram criar, o que nos deverá servir de aviso de que ainda temos muita coisa para melhorar. No lado oposto temos a alegria de ver onze jogadores a jogar um futebol solidário, por vezes com rasgos de genialidade, com coração suficiente para virar uma péssima exibição com dois golos sofridos, transformando-a numa goleada à moda antiga. É difícil, quase contra natura, dizer que uma equipa que marca 9 golos em dois jogos, não está a jogar grande coisa. Mas também não me sinto confortavel em dizer que somos uma máquina de jogar futebol, como estes números parecem indicar. A realidade andará algures pelo meio, entre a genialidade de Bruno Fernandes, Bas Dost ou Nani, a disponibilidade de Coates, Mathieu ou Renan, o sangue quente de Acuña, a irreverência de Miguel Luís, os rasgos de Jovane e as alternâncias de Bruno Gaspar e Gudelj. Temos um onze-tipo onde jogadores fora-de-série partilham o relvado com jogadores banais. O colectivo que nasce desta mistura, que é afinal a grande obra de Keizer, consegue essa coisa espectacular de conseguir retirar dos jogadores o melhor que tem para dar. Os maus momentos durante o jogo são reminiscências de uma equipa que ainda procura o equilíbrio entre o genial e o medíocre. E nada melhor do que estarmos a menos de duas semanas da abertura da janela de transferências de inverno, para percebermos onde poderemos reforçar esse equilíbrio.
Assim de repente, saltam à vista as laterais defensivas. Bruno Gaspar continua-me a parecer um Schelotto de pele morena e Ristovsky, que considero melhor, está longe de ser um portento. No lado esquerdo as coisas não parecem melhores. Acuña cumpre a atacar mas os constantes constrangimentos disciplinares acabam quase sempre por anular o que de bom traz à equipa. Quanto a alternativas ao argentino, elas resumem-se a um Jeferson completamente fora de prazo e a um Lumor que continua sem convencer os treinadores que passam por Alvalade. 
Quanto ao resto dos sectores, não creio que o meio-campo esteja tão necessitado de sangue novo como as nossas laterais ofensivas. As lesões de Bataglia e Wendel criaram-nos constrangimentos temporários, mas são casos temporários (no caso do brasileiro). Parece-me razoável permitir o regresso de Francisco Geraldes, juntando-se a Miguel Luís e a Bruno Paz como alternativas razoáveis naquela posição. Sim, eu fui dos que ficou maravilhado com a estreia de Bruno Paz na quinta-feira e acho que temos ali uma pérola para trabalhar. Quanto a Bruno César, não é possível esperar mais dele do que uma boa alternativa para equilibrar a equipa a partir do banco, com o resultado já controlado. A sua titularidade ontem demonstrou ter sido um equívoco, que acredito que não se voltará a repetir.
Nas alas, o regresso de Raphinha trará mais uma excelente opção ao onze. Diaby continua a não me convencer, pois parece-me um jogador que joga a espaços e não de forma continuada. Vai cumprindo a sua missão, mas sem grandes rasgos. Jovane consegue agitar mais as águas, especialmente quando entra na segunda parte, faltando-lhe ainda consistência para fazer 90 minutos em alto nível. Nani, apesar da genialidade que empresta ao jogo, já não tem a disponibilidade física de antigamente, como se viu ontem. Diria que regressando Matheus Pereira, talvez ficássemos com as alas suficientemente equilibradas. Não regressando este, fará sentido um investimento avultado nesta posição? Não teremos alguém nos sub-23 capaz de ser alternativa?
Quanto ao ataque, neste momento temos apenas um avançado-centro de raiz. Podemos ponderar em fazer regressar Gelson Dala, mas estará o angolano em condições de substituir o holandês voador? Numa primeira fase de adaptação, Gelson Dala até poderia servir de complemento a Bas Dost, mas como avançado único, creio que não serviria. Mas entre comprar um Barcos ou apostar num Dala, que é que se seria preferível? Agora, se estivéssemos a falar em Slimani, isso já seria diferente...
Não me lembro da última vez que cheguei ao Natal só com vitórias em casa (para o campeonato). Mesmo com os constrangimentos dos últimos dois jogos para o campeonato, é visível que estamos a jogar um futebol apelativo e em crescendo. Temos uma equipa motivada e moralizada, com o melhor ataque do campeonato. Neste momento dependemos só de nós para ser campeões. É um objectivo exequível? É, mas ainda temos muitas dificuldades para ultrapassar e chegar ao nível dos nossos rivais directos. Mas deixem-me sonhar por agora. Venha de lá o Rio Ave e o Vitória de Guimarães, que eu quero é ver o Sporting a jogar! 

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Sinais de esperança

A estreia de Marcel Keizer não podia ser mais auspiciosa, surpreendendo até mesmo os mais optimistas. Todos os sportinguistas sabiam que esta equipa estava em sub-rendimento nas mãos de Peseiro, que os nossos jogadores poderiam fazer muito melhor. Mas poucos esperavam que, em apenas duas semanas, o nosso futebol se transfigurasse desta maneira. Não tenho memória de uma troca de treinadores ter sido tão bem aproveitada como esta. Nem mesmo Inácio, quando substituiu Materazzi em 1999, conseguiu uma entrada tão fulgurante.
Ontem, num dos estádios mais complicados do nosso campeonato, vimos um Sporting com personalidade, intermediando momentos de futebol genial com outros de puro pragmatismo. Não haverá sportinguista algum que não se tenha deliciado com as trocas de bola ao primeiro e segundo toque no meio-campo, permitindo à equipa transportar o jogo quase de forma vertiginosa para o ataque. Parece impossível, mas esta era a mesma equipa que há umas semanas atrás atacava com chutões de Coates para a frente, ou que na época passada andava a trocar a bola no meio-campo, numa "ideia de jogo" que ainda hoje é incompreensível. Qualquer semelhança entre este Sporting e o que levou quatro 4 golos do Portimonense, é uma triste coincidência. Só espero agora que os defensores de Peseiro metam em definitivo a viola do saco e desapareçam para a galáxia mais distante.
Tendo Marcel Keizer feito com distinção o seu tirocínio, resta-nos agora olhar para o resto da época, para tentarmos perceber o que é que ainda há para fazer. E se por um lado os sinais iniciais são muito animadores, por outro há que ter alguma sobriedade e não embandeirar já em arco. Até porque o próprio Keizer reconheceu, na flash-interview, que há ainda muitos aspectos a melhorar. E temos mesmo de melhor. Renan, por exemplo, apesar das intervenções decisivas na segunda parte, teve algumas abordagens com os pés que voltaram a causar calafrios. Os nossos laterais ainda estão longe de convencer. Continuo a achar que Bruno Gaspar é um Schelotto versão morena e Jefferson, como alternativa a Acuña, parece curto. O meio-campo parece a zona do terreno onde temos maior qualidade, especialmente desde que Wendel começou a jogar. Mas se por um lado o nosso meio-campo revelou ontem momentos de genialidade, por outro teve alturas do jogo onde se deslumbrou e desconcentrou, especialmente após o 3-1. Já no ataque, Diaby revelou-se ainda pouco entrosado na nova dinâmica do colectivo, relevando demasiada atrapalhação. E depois Bas Dost, o nosso abono, que continua a ser a única opção para homem-golo da equipa, restando-nos aqui a esperança de que a nova dinâmica de jogo da equipa distribua por mais jogadores a missão de marcar golos, tirando-nos a dependência do holandês voador, relevada nas últimas temporadas.
O caminho faz-se caminhando e domingo teremos mais um desafio a este novo leão. Jogaremos em casa contra uma equipa que faz o jogo típico do nosso campeonato: autocarro em frente à baliza e pontapé para à frente para os contra-ataques. 
Que o nosso bom futebol continue a ser demonstrado em campo, é tudo o que para já peço.